aumentaram em 2015
Rendimentos do trabalho<br>representam apenas<br>33,7 % do PIB
O Instituto Nacional de Estatística (INE) publicou já este ano as Contas Nacionais Anuais de 2015. Estas contêm dados importantes sobre a evolução da situação do País, nomeadamente sobre os efeitos das políticas que têm sido seguidas nas diversas áreas, que merecem reflexão. A linguagem fria e objetiva dos dados oficiais sobrepõe-se aos comentários e afirmações daqueles que, por terem acesso fácil aos media, pensam que podem reconstruir a «realidade» de acordo com os seus desejos e sem qualquer objetividade.
LUSA
A repartição primária do rendimento entre o trabalho e o capital, para utilizarmos um conceito simples e compreensível, revela uma contínua deterioração da parte do rendimento que cabe ao trabalho como mostra o Gráfico 1 elaborado com dados do INE.
Em 2009, os «Ordenados e salários» representaram 37,4 por cento do valor do PIB deste ano; em 2010 desceu para 36,8 por cento e a partir desse ano a diminuição foi contínua, atingindo apenas 33,7 por cento do PIB em 2015, o valor mais baixo dos últimos 20 anos, que é o período contemplado pelo gráfico (3,4 pontos percentuais do PIB é = a mais de 6000 milhões de euros).
Para se poder ficar com uma ideia mais clara da profunda injustiça e desigualdade que se verifica em Portugal na repartição da riqueza criada, interessa referir que os trabalhadores que em 2015 receberam um valor correspondente apenas a um terço da riqueza criada no País (do PIB) nesse ano representavam 81,6 por cento da população empregada (os trabalhadores por conta de outrem eram 3 710 600 num total de 4 548 700 empregados), que é aquela que produz a totalidade da riqueza criada no País.
Estamos a falar na repartição primária da riqueza ilíquida criada anualmente no País.
Mas não é este ainda o rendimento disponível que os trabalhadores recebem (levam para casa). Este rendimento ilíquido está sujeito a inúmeros impostos (repartição secundária), nomeadamente o IRS, que nos últimos anos sofreu um aumento enorme que amputa uma parcela importante dos seus rendimentos. Segundo o Ministério das Finanças (estatísticas da AT), em 2013 (últimos dados disponibilizados), 62 por cento dos rendimentos declarados para efeitos de IRS foram rendimentos do trabalho. Em 2015, o IRS cobrado pelo Estado atingiu 12 693,3 milhões de euros, como consta do relatório do OE-2016. É importante ter em conta que esta grave desigualdade na repartição da riqueza criada no País, que se tem acentuado nos últimos anos, para além de ser um fator de pobreza é também um obstáculo importante ao crescimento e ao desenvolvimento do País.
Riqueza transferida para
o exterior aumentou em 2015
O Produto Interno Bruto (PIB) é a riqueza criada anualmente no País. Já o Rendimento Nacional Bruto (RNB) é a riqueza que fica no País e que é depois distribuída pelos residentes. Como revelam os dados do INE do Quadro 1, no período 2010-2015, o PIB tem sido sempre superior ao RNB, o que revela uma perda permanente de uma parcela da insuficiente riqueza criada (só em 2018 é que o PIB será igual ao de 2007), a qual é transferida para o exterior, indo beneficiar os residentes de outros países (por exemplo, a Alemanha).
No período 2002-2015, desde que Portugal entrou para a Zona do Euro, a riqueza criada em Portugal (PIB) foi superior à riqueza que ficou em Portugal (RNB) em 55 825 milhões de euros, o que corresponde a cerca de um terço da riqueza criada em média anualmente neste período. Isto significa que esta riqueza criada pelos portugueses não foi distribuída internamente, não beneficiando os portugueses, mas indo beneficiar os habitantes de outros países. Mais um obstáculo ao crescimento e desenvolvimento do País.
«Crescimento negativo» do investimento
põe em causa o presente e o futuro
Um outro obstáculo ao crescimento e ao desenvolvimento é o que se tem observado no investimento. Em Portugal, tem-se verificado nos últimos anos aquilo que, para chamar a atenção para um facto grave pouco referido, se pode designar por «crescimento negativo» do investimento, ou seja, que o investimento feito em cada ano (FBCF) é inferior ao desgaste do investimento total realizado e acumulado no País nesse ano (Consumo de Capital Fixo). Os dados do Quadro 2, do INE, revelam essa preocupante realidade que os media ignoram ou ocultam, embora as consequências sejam graves para Portugal.
Segundo os dados do INE, a partir da intervenção da troika e da entrada em funções do governo PSD/CDS, registou-se uma diminuição muito grande no investimento realizado (entre 2010 e 2011, baixou de 36 937,7 milhões de euros para 32 451,8 milhões de euros, ou seja, diminuiu em 12,14 por cento em apenas um ano; e depois de 2011, o investimento realizado em cada ano nunca foi suficiente para compensar o investimento que é consumido, ou seja, que se degrada e desaparece, e é amortizado. Assim, entre 2012 e 2015, o saldo foi negativo e somou 15 904,8 milhões de euros, ou seja, a soma da FBCF realizada nesse período foi inferior ao Consumo de Capital Fixo nesse período em 15 904,8 milhões de euros, o que significou que uma parte do aparelho produtivo desgastado e destruído pela utilização e envelhecimento não foi renovado, diminuindo assim a capacidade produtiva nacional, e tornando mais difícil a recuperação económica e o desenvolvimento do País no futuro.
É esta situação que o atual Governo tem de inverter rapidamente. No entanto a quebra do investimento público para valores ainda mais baixos do que anteriormente, constante do Orçamento do Estado de 2016 (apenas o correspondente a dois por cento do PIB), não é animador nem garante que isso realmente aconteça, tendo em conta a forte retração do investimento privado que se continua a verificar. A confirmar isso está a previsão do Banco de Portugal de Março de 2016, recentemente divulgada, de um crescimento no investimento (FBCF) de apenas 0,7 por cento em 2016, quando a previsão feita em Dezembro de 2015 tinha sido de um aumento de 4,1 por cento. Com esta redução tão grande na taxa de crescimento do investimento, a criação de emprego também pouco aumentará. Não há milagres na economia nem no emprego.